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Abraham Palatnik Abraham Palatnik

Anita Schwartz Galeria festeja um ano de atividades em seu espaço na Gávea com uma mostra individual de Abraham Palatnik, reconhecido internacionalmente como um dos pioneiros da arte cinética. A exposição, que tem curadoria de Guilherme Bueno, apresenta 19 trabalhos recentes e inéditos, 11 pinturas da série “Progressões”, e oito feitos especialmente para a galeria.  Destes, Palatnik mostra três “pirâmides”, de 58 cm de altura, pesquisa iniciada este ano por ele, dois cinéticos também de 2009, em que resgata projetos de 1967, e três serigrafias criadas a partir da série “Permutáveis”.

DE 28.Mai.2009 A 27.Jun.2009

Leia o texto da Exposição

HISTÓRIAS E ESTÓRIAS DA COR

 

Guilherme Bueno

 

A arte, desde a modernidade, incorporou definitivamente para si a idéia de se constituir como pesquisa. Tal consideração deve, acima de tudo, ser vista como a busca persistente por novas maneiras de um pensar visual sistemático, algo que não só impulsiona o surgimento de outras linguagens (exemplificado pela relação inventiva com novas tecnologias) como também é capaz de formular novas perguntas sobre termos quelhe  pareceram desde sempre ser característicos – a cor, a forma, o suporte, etc. Ao contrário de representar uma solução conciliatória de compromisso, o reconhecimento de tais variantes expõe antes a abrangência de caminhos que configuram a arte contemporânea.

 

Abraham Palatnik historicamente tem se valido desta riqueza de possibilidades. Hoje é mais do que reconhecido seu pioneirismo na década de 1950 com os cinecromáticos e depois com os cinéticos que traziam à tona uma nova abertura para o problema da cor e do movimento no espaço que ocupara toda a primeira metade do século XX. Ao mesmo tempo o artista desde então se concentra igualmente em verificar tais qualidades no campo da pintura, buscando ativar naquela superfície equivalentes dos movimentos físicos efetuados por seus objetos.

 

A exposição de Palatnik na Anita Schwartz Galeria de Arte oferece um repertório desta investigação, um experimento no qual todas as variáveis sempre são testadas, mas, diferente de um método estritamente científico, ao invés de procurar uma resposta, prefere lançar várias delas, todas igualmente verdadeiras – acrescente-se que é esta diversidade que lhe confere sua irrefutável pertinência. Ali são vistos cinco vertentes de seu trabalho: as pinturas, os cinéticos, monocromáticos em papel, serigrafias e seus mais recentes objetos, uma espécie de prisma pictórico. Entre eles podemos ver as relações internas entre uns e outros que perfazem sua obra.

 

Dentre elas, destaca-se o elo entre espacialidade e cor, constantemente interessado em faze-las, muito além de vibrar, fundar uma temporalidade da forma, isto é, coloca-las em ação, pô-las em movimento pelo deslocamento efetivo das partes (como nos cinéticos, em que, cada rotação das formas, que sempre ritmadas – ao invés de se mexerem sozinhas – criam a cada circunvolução nova trama compositiva e de interação cromática), pela reconfiguração do suporte (nos trabalhos em papel, em que os cortes meticulosos criam planos que avançam e retrocedem, atestando a obtenção peculiar de um movimento estático), pela intensidade da cor (nas pinturas, que, formadas pela colagem lado a lado de pequenas tiras transplantam para o quadro uma dinâmica ótica que nos outros casos era obtida por uma espacialização literal). Enquanto nos cinéticos prevalece uma recombinação estrutural permanente – já que a cada instante os elementos intercambiam sua função no campo –, nas pinturas a luminosidade é pautada via de regra por uma cor predominante que faz as demais emergirem ou fundirem-se conforme seus contrastes e harmonias. Neste sentido, as passagens entre amarelos e vermelhos, entre azuis mais claros ou escuros, entre brancos e rosados constrói um tempo visual entre os planos, agitando-os pela disposição ritmada dos feixes.

 

No mesmo viés podemos analisar as serigrafias e o objeto. No primeiro caso, trata-se de uma questão de correspondências. Baseadas em pinturas mais antigas do artista, as serigrafias indicam como uma cor pictórica converte-se em uma cor gráfica, como ela, impressa, intenta transferir uma luminosidade e textura outrora obtida eventualmente com uma pintura jateada (e, acrescente-se, como ambas indicam uma aproximação com uma cor já industrial). O objeto, por sua vez, representa um novo viés cogitado por Palatnik. Podemos vê-lo como uma espécie de síntese das suas outras experiências: a pintura ganha uma volumetria familiar aos sólidos antes desenhados virtualmente pela rotação dos planos componentes dos cinéticos. As protuberâncias e relevos que desenhavam os cartões – e faziam com que se promovesse uma continuidade entre suporte e as formas que o ocupavam – adquirem concisão, de modo a coincidir os espaços internos e a exterioridade do objeto (não há mais formas dentro do limite do cartão, elas são a própria coisa). Mais além, convergem a percepção dinâmica dos cinéticos e aquela ótica das pinturas, posto que as cores seguem todas as faces do prisma, “rotacionadas” e fixas a um só tempo. Seria o caso de notar como elas lidam de maneira bastante particular com espectador ativo presente na arte contemporânea, quando diante deste tipo único de pintura/objeto.

 

Ao mostrar-se disponível a conjugar e/ou examinar paralelamente hipóteses de experiência da forma, a obra de Palatnik formula uma ciência estética da visão – uma ciência, porém, que ultrapassa o antagonismo entre pensamento racionalista e intuição sensível, trabalhando-os antes sua simbiose e a convicção de revigorar a percepção. Ela reitera uma relação com um mundo crescentemente envolvido pela tecnologia conservando, porém, um humanismo não-nostálgico, e sim entusiástico, persistente, renovado obra a obra.