Livia Flores em “Espaços do ainda”
A artista Lívia Flores integra a mostra coletiva “Espaços do ainda”, no Paço Imperial. Com curadoria de Luiz Cláudio da Costa, a exposição, que é resultado de um projeto de pesquisa sobre as relações entre arte e precariedade desenvolvido na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em parceria com o Arquivo Nacional (RJ), propõe-se a debater se a precariedade pode ser uma imagem a fundamentar a arte política.
“As Horas de Lívia Flores é uma instalação composta por três trabalhos, “Eles riram”, 2019-2022, “Sem título (as Horas)”, 2018-2019 e “Pedras”, 1993-1994. Cada um deles coleta elementos, partes de uma série aberta ou fechada. Trabalho arquivista de si, recolhe os rastros do próprio labor em ruína. Em comum, a referência ao tempo – o tempo em que vivemos e o tempo manifesto nas marcas da sua passagem sobre as matérias que ali comparecem: folhas de jornal, pedras de gesso, um ex-prato de porcelana ornado com as letras do alfabeto.
A infância – as infâncias, aos cacos giram os ponteiros de um relógio cortante, ora avançando ora retrocedendo, as Horas – as Horas, que palavras soletram? E-l-e-s-r-i-r-a-m. 80 desenhos em guache preto cobrem folhas de jornal em memória aos 80 tiros disparados por uma unidade do Exército sobre o carro do músico Evaldo Rosa e sobre o catador Luciano Macedo, que em vão tentou socorrer a família alvejada a caminho de um chá de bebê num domingo de sol em Guadalupe, Rio de Janeiro, 7 de abril de 2019.
“Eles riram. Chamei eles de assassinos e eles riram.” O testemunho de Luciana Oliveira, viúva de Evaldo, é a manchete única dos diários impressos. Todo dia. Eles riram. Placas de gesso expostas ao tempo, da série Pedras. Pedras, nome genérico para forma-espelho; inclui Pedras Candelária e Pedras Vigário Geral, que remetem a duas chacinas ocorridas no Rio de Janeiro no ano de 1993. Partidas pisoteadas recobertas por outras camadas de gesso guardadas expostas – ao tempo, ressurgem – à flor da pele.”
Foto: Wilton Montenegro