VISTAS DE DENTRO – Visita ao Acervo #5
Vistas de dentro reúne 16 trabalhos de artistas representados e convidados, propondo reflexões sobre o lar como espaço simbólico, afetivo e poético. Com curadoria de Cecília Fortes, a mostra marca a quinta edição do programa Visita ao acervo e parte da ideia de casa como extensão do corpo, da memória e da identidade. Entre pinturas, esculturas, fotografias, instalações e vídeo, os trabalhos abordam temas como arquitetura, intimidade, materialidade e transformação.
DE 16.Jul.2025 A 23.Ago.2025
VISTAS DE DENTRO - VISITA AO ACERVO #5
VIEWS FROM WITHIN – VISIT TO THE COLLECTION #5 [english version]
“Em todas as almas, como em todas as casas, além da fachada, há um interior escondido.”1
Raul Brandão
A exposição coletiva “Vistas de dentro” dá continuidade ao programa “Visita ao acervo”, cuja proposta é criar diálogos entre obras selecionadas do acervo da Anita Schwartz Galeria de Arte com trabalhos de artistas representados e alguns convidados, através de um recorte curatorial.
Para esta quinta edição, o ponto de partida foi a ideia de casa. A casa pensada primeiramente como moradia e espaço doméstico. Mais do que um local de refúgio e proteção das adversidades do tempo e das ameaças urbanas, um lugar de acolhimento, de descanso, de conexão consigo mesmo e de convívio com o outro, um outro cuja familiaridade abre as portas para este universo particular. Um espaço de extensão do ser, a personalidade expressa na escolha e na disposição dos objetos. O eu ou o nós que ali habitam, alheios ao olhar externo. A intimidade abrigada. Quantas histórias e pensamentos não estão entranhados nas paredes de uma casa?
Em “Filosofia da casa”, Emanuele Coccia elabora que não construímos casas apenas para nos proteger das intempéries, e nem para fazer o espaço coincidir com a ordem da genealogia ou o nosso gosto estético. Ele diz que cada casa é uma realidade puramente moral: construímos casas para acolher intimamente o bocado de mundo – feito de coisas, pessoas, animais, plantas, atmosferas, eventos, imagens e lembranças – que tornam a nossa felicidade possível2.
Extrapolando o conceito inicial, a casa aqui é pensada também de forma alegórica, incorporando a metáfora da casa como representação do corpo ao relacionar o corpo-matéria à morada da alma. Amplia-se assim o repertório conceitual e imagético que compõe a mostra.
“Vistas de dentro” reúne obras que retratam o ambiente doméstico, permeado pelo afeto: o registro de um lugar valioso eternizado por Luiza Baldan; o sono angelical de Marie, filha da pintora Marjô Mizumoto, com seu universo pop infantil no entorno; o jogo de guardanapos do enxoval dos pais de Renato Bezerra de Mello, herdado pelo artista, com detalhes encobertos por pontos livres de bordado feitos por ele junto com parentes e amigos, num gesto de apropriação e aproximação; a mesa posta de Patrizia D’Angello, em torno da qual as reuniões de família acontecem; a pintura da sala vazia no momento que antecede à partida indesejada, gesto de solidariedade da artista Jeane Terra à dor de uma família obrigada a se mudar contra a própria vontade; o interesse pela costura e a arte têxtil, desencadeados ainda na infância, enquanto observava a mãe trabalhando na máquina de costura num quartinho dentro de casa se apresenta na composição de Arthur Chaves.
Numa outra esfera, a coletiva traz trabalhos que se relacionam com arquitetura e representação, resíduos e pesquisa de materiais. Entre eles, a delicada escultura em metal de Nathalie Ventura; a casa peluda que brotou na imaginação da artista Cristina Salgado em meio a uma massa amorfa rosada; a gaiola de madeira de Palo Santo em forma de casa, de Gustavo Riego, que abriga uma nota de um dólar, transparece uma sensação de calma, leveza e abertura mas referencia questões sociais para abordar temas de liberdade, poder, perda e injustiça; os escombros impregnados de memória de uma casa em ruínas, transformados em escultura por Jeane Terra e a composição de Duda Moraes, montada com costura de resíduos de tecidos de estofado descartados, convertidos em jardins têxtis pelas mãos da artista.
A vertente metafórica casa-corpo se apresenta nos trabalhos de Liana Nigri, cujo processo escultórico se desenvolve através de gestos de contato do corpo com a matéria que resultam na impressão da memória de uma presença, um mapa sensorial de conhecimento íntimo, e nas pinturas de Luiz Eduardo Rayol, que entrelaçam o corpo-carne com o corpo-energético em questionamentos metafísicos sobre a potência da natureza e a fragilidade da nossa existência.
E, para fechar a exposição, convidamos o visitante para um mergulho imersivo no container para a apreciação da videoarte de Maritza Caneca.
Cecília Fortes
1 Frase de autoria de Raul Brandão (1867–1930), escritor, jornalista e dramaturgo português. Epígrafe do livro “Claraboia”, de José Saramago, 2ª ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
2 “Filosofia da Casa: espaço doméstico e felicidade”, Emanuele Coccia, tradução Alice Alberti Faria, 1ª ed.. Rio de Janeiro: Dantes Editora, 2024.
ARTHUR CHAVES
Sem Título
, 2019
Técnica mista | 72 x 72 cm
JEANE TERRA
A despedida
, 2023
Óleo sobre tela | 70 x 100 cm
PATRIZIA D’ANGELLO
A espera de Alice
, 2014
Aquarela sobre papel de algodão | 140 x 154 cm
PATRIZIA D’ANGELLO
Matriarcado
, 2018
Óleo sobre linho | 88 x 90 cm
RENATO BEZERRA DE MELLO
Bordando em silêncio (#1,#2,#3,#4,#5)
, 2009
Jogo de toalhas de mesa em linho estampado, bordado livre em algodão | 40 x 40 cm (variáveis
RENATO BEZERRA DE MELLO
[detalhe]
LIANA NIGRI (escultura)
Em tensão, da série Vazante, Edição 1 : 3
, 2019
Mármore em liga e recipiente de vidro com água | Dimensões Variáveis
NATHALIE VENTURA
Escavar com as mãos os metais – n.10
, 2024
Malha de ferro, fio de aço e hematita | 21,5 x 21,5 x 4 cm
CRISTINA GRANATO (escultura)
Casa Peluda
, 2024
MDF, papel machê, massa acrílica, unha de plástico, tinta PVA, esmalte de unhas, pelúcia | 42 x 29 x 26 cm
DUDA MORAES
Textile
, 2022
Montagem com costura sobre tecido | 28 × 28 cm
LUIZA BALDAN
Sem título, série Leituras de um Lugar Valioso
, 2012
Fotografia Edição: 1 : 3 | 110 x 140 cm
LUIZ EDUARDO RAYOL
Toda História do Mundo - Muladhara
, 2022
Acrílica, têmpera e papel | 130 x 80 cm
Marjô Mizumoto
"Hello, how are you?” (Marie Yuki Mizumoto Gomes)
, 2024
Óleo sobre tela | 180 x 130 cm
GUSTAVO RIEGO
Songe
, 2023
Madeira, Metal e Papel | 27 x 32 x 17 cm
JEANE TERRA
O Beijo
, 2018
Escombro, folha de ouro e pó de pelúcia | 50 x 29 x 23 cm
JEANE TERRA
Alma púrpura
, 2020
Escombros e pó de pelúcia | 40 x 35 x 13 cm
MARITZA CANECA
Submersion in blue x3
, 2025
Videoarte HD em loop
LUIZ EDUARDO RAYOL
Toda História do Mundo - Anja
Acrílica, têmpera e papel | 72 x 72 cm