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Wanda Pimentel Geometria/Flor

Anita Schwartz Galeria de Arte apresenta, a partir do dia 8 de setembro para convidados e do dia seguinte para o público, a exposição “Geometria/ Flor”, com cerca de 35 obras inéditas da artista carioca Wanda Pimentel (1943).

DE 08.Set.2015 A 17.Out.2015

Leia o texto da Exposição

O ÚLTIMO SORTILÉGIO

Fernando Pessoa

 

 

 

 

‘’Já repeti o antigo encantamento,

E a grande Deusa aos olhos se negou.

Já repeti, nas pausas do amplo vento,

As orações cuja alma é um ser fecundo.

Nada me o abismo deu ou o céu mostrou.

Só o  vento volta onde estou tôda e só,

E tudo dorme no confuso mundo.

 

“Outrora meu condão fadava as sarças

E a minha evocação do solo erguia

Presenças concentradas das que esparsas

Dormem nas formas naturais das coisas.

Outrora a minha voz acontecia.

Fadas e elfos, se eu chamasse, via,

E as fôlhas da floresta eram lustrosas.

 

 

“Minha varinha, com que da vontade

Falava às existências essenciais,

Já, se o círculo traço, não há nada.

Murmura o vento alheio extintos ais,

E o luar que sobe além dos matagais

Não sou mais do que os bosques ou a estrada.

 

 

“Já me falece o dom com que me amavam.

Já me não torno a forma e o fim da vida

A quantos que, buscando-os, me buscavam.

Já, praia, o mar dos braços não me inunda.

Nem já me vejo ao sol saudado erguida,

Ou, em êxtase mágico perdida,

Ao luar, à boca da caverna funda.

 

“Já as sacras potências infernais,
Que, dormentes sem deuses nem destino,

À substância das coisas são iguais,

Não ouvem minha voz ou os nomes seus.

A música partiu-se do meu hino.

Já meu furor astral não é divino

Nem meu corpo pensado é já um deus.

 

 

‘’E as longínquas deidades do atro poço,

Que tantas vezes, pálida, evoquei

Com a raiva de amar em alvorôço,

Inevocadas hoje ante mim estão.

Como, sem que as amasse, eu as chamei,

Agora, que não amo, as tenho, e sei

Que meu vendido ser consumirão.

 

 

‘’Tu, porém, Sol, cujo ouro me foi prêsa,

Tu, Lua, cuja prata converti,

Se já não podeis dar-me essa beleza

Que tantas vezes tive por querer,

Ao menos meu ser findo dividi –

Meu ser essencial se perca em si,

Só meu corpo sem mim fique alma e ser!

 

“Converta-me a minha última magia

Numa estátua de mim em corpo vivo!

Morra quem sou, mas quem me fiz e havia,

Anônima presença que se beija,

Carne do meu abstrato amor cativo,

Seja a morte de mim em que revivo;

E tal qual fui, não sendo nada, eu seja!”